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Feira de Sevilha, a grande explosão da cor e do folclore.

Chegam envoltas num frufru de folhos flamencos, arrastando atrás de si uma explosão de cores e perfumes. As sevilhanas exultam a sua natural beleza carregando no batom e no rouge, acessórios coloridos, brincos vibrantes, o mistério dos xailes, o baile dos tacões e as curvas sedutoras dos trajes de gitana. Estamos na “Feria de Sevilla”, também conhecida como a “Feria de Abril” ou Feira da Primavera. Este ano e graças aos desígnios do calendário, a Feria começou à meia-noite de sábado com o "Alumbrao" e decorre durante toda a primeira semana de Maio, terminando no próximo fim de semana, em concreto no domingo, dia 6.

Vim assistir ao primeiro dia oficial da Feira de Sevilha, domingo dia 30 de Abril e nada do que li na internet me preparou para esta explosão de cor e arte. Hoje é o dia mais importante, o começar das festas e a apresentação à sociedade das "casetas" meticulosamente decoradas, um desfile equestre à Alexandre Dumas com carruagens e cavalos engalanados e é quando se estreiam os trajes de flamenca comprados ou mandados fazer especialmente para a ocasião.

A “Feria” desenrola-se nas estradas empedradas do “Real” ladeadas pelas "casetas" de festa onde se come e bebe e uma zona de circo e parque de atrações, tipo feira popular. As "casetas" são uma espécie de barracas de luxo de vários módulos, recobertas a lona de tiras verdes e brancas ou vermelhas e brancas, com uma sala de festas na parte frontal e um bar-cozinha na traseira. As “casetas” são uma forma de demonstrar o poder aquisitivo e a vontade de bem receber da família, associação de amigos ou vizinhos. Têm serviço de comida e bebida organizado pela família proprietária, música e decoração.

A "caseta" é muito mais que um lugar para festejar e receber amigos, é uma metáfora viva de quem são os Andaluzes: famílias tradicionais e numerosas, religião, “arte”, música, bom comer e bom beber, tradição equestre e orgulho na raça. No contexto andaluz, diz-se que uma pessoa tem "arte" quando apresenta graça, fogo e vivacidade, sabe bailar, rir-se, entreter e ser agradável socialmente.

Este ano, uma das novidades especialmente para quem é de fora e visita a “Feria” como turista é existirem 9 “casetas” públicas. Uma delas tem caráter internacional já que os empregados de mesa falam português, alemão, inglês, russo e até árabe. Trata-se de uma iniciativa da Câmara Municipal de Sevilha (El Ayuntamiento) para promover a boa receção do turista internacional. Mas a tradição da “Feria” não é turística e supõe que quem a visita é um “insider” ou seja, conhece alguém, familia, amigo ou colega de trabalho. A maioria das 1.200 “casetas” é privada e algumas até têm segurança à entrada para prevenir a visita de convidados indesejados.

Os momentos da "Feria"

Os hotéis estão cheios e as tarifas ascendem a valores quase insultantes. No hotel mais emblemático e luxuoso de Sevilha, o Alfonso XIII nestes dias, a noite chega a custar mais de 1.500 euros e é quase impossível conseguir uma reserva. Depois de muita procura acabámos por ficar no Barceló Sevilha Renascimiento, por 270 euros, sem pequeno almoço.

As portas da "Feria" abrem oficialmente às 13:30 mas o relógio social dita chegar por volta das 15:30. A chegada é marcada por um trafico caótico, ouvem-se as buzinas, o pára-arranca dos motores, o acumular de táxis e autocarros e o relinchar nervoso dos cavalos. As grandes famílias chegam em carruagem de cavalos decorada com panos de veludo com o monograma bordado a ouro da família ou da sua “hacienda” andaluza.

A entrada da "Feria" é decorada cada ano com um tema específico e a sua apresentação oficial e iluminação é um ato exclusivo “El Alumbrao” só para sócios. Este ano, a porta da Feria é uma homenagem à Expo de Sevilha que se celebrou em 1992 e marcou um momento importante no desenvolvimento da cidade e da região. Hugo Montalbán é o artista que assinou o desenho deste monumento perene intitulado "Sevilla Cultura Universal". A porta é uma construção impressionante com dois arcos de 40 metros de altura e minaretes laterais inspirados nas louças tradicionais da Fabrica de Sevilha Pickman e pesa mais de 240 mil quilos. No topo dos arcos da "portada" vigia “Curro” a mascota da Expo de 92, tão acarinhada pelos sevilhanos. Há noite, a porta ganha nova vida com a esplendorosa iluminação de 25.000 lâmpadas. Só o orçamento desta entrada da "Feria" ronda os 450 mil euros...

O "Alumbrao" da porta realiza-se na noite anterior à abertura oficial da Feria, num jantar de peixe frito exclusivo para os sócios. Presunto "pata negra", tortilha de batatas e cebola, peixe frito "pescaíto frito", manzanilha e vinho, muito vinho, são os essenciais na mesa da "Feria". Aqui come-se, bebe-se e dança-se. Há música ao vivo em várias “casetas”, grupos de flamenco mais singelos com cantor e guitarrista ou verdadeiras orquestras com bailarinas incluídas. Tudo depende do tamanho da “caseta”. O mais comum é o duo de guitarras e cantor que toca sevilhanas e canções flamencas.

O género das sevilhanas é o favorito para a dança. Pessoas de todas as idades bailam em pares as diferentes coplas seguindo um protocolo de passos e giros sincronizado. É hipnotizante observar as raparigas quando bailam em grupos coloridos à porta das “casetas”. As saias de folhos rodopiam, os fios dos xailes realçam os movimentos sensuais dos braços, uma dança belíssima e de longa tradição. As crianças seguem os passos das mães e irmãs desde tenra idade. Sem o colorido dos trajes e as danças de sevilhanas esta "Feria" não seria a mesma. (na conta de Instagram do Avenida há videos deste baile).

As carruagens de cavalos passeiam-se de forma incessante por toda a feria. É um desfile incrível de amazonas e cavaleiros altaneiros aprumados com traje de equitação e chapéu de pele de coelho. Os carros são decorados com o monograma da família ou da “hacienda”. Há cavalos de pura sangue que se passeiam com ar imponente, mas também há cavalos de menor linhagem que trotam orgulhosos engalanados com "madronhos" uns pequenos berloques coloridos.

Não é preciso ser-se proprietário de uma "hacienda" com cavalos para figurar na “Feria”. As carruagens, os cavalos e o serviço de cocheiros alugam-se por 700 euros por dia. (Aqui fica o contato de Manuel "el cochero" tel. 0034 627 800 141). Debaixo do assento da carruagem existe uma arca frigorífica para guardar bebida e comida. Portanto, outra forma de viver a “Feria” é a passear pelas ruas e com o pic-nic a bordo.

Os cavalos só podem circular até às 20:00. A essa hora retiram-se as carruagens das estradas empedradas e chegam as máquinas para limpar os excrementos dos animais, deixando as ruas livres para o desfilar da multitude de pessoas que desfrutam da “Feria” de noite... e a festa pode durar até às cinco da manhã...

Dizem os sevilhanos que para entrar e sair da "Féria" é preciso paciência, muita paciência. E a nossa saída, foi no mínimo uma grande prova de paciência. Resolvemos sair às 00:30 depois de 10 horas de “Feria” (somos uns campeões!). Não contámos com a enorme fila de hora e meia à espera de táxi... e a espera foi um verdadeiro sacrifício porque as dores nos pés começaram a tornar-se insuportáveis e o vestido a pesar nos ombros. Esta foi a melhor altura para sair, porque depois da uma da manhã, começam a chegar centenas de jovens que fazem “botellón” nas ruas, troca-se o flamenco pelo “reggaeton” desvirtuando-se a alma gitana da “Feria”...

Para além das festividades no “Real” a praza de touros de Sevilha “A Maestranza” oferece diariamente durante a semana da “Feria” os melhores eventos taurinos, com cavaleiros de grande prestígio. Ontem, foi o dia dos “enganches” um momento protagonizado por mais de 80 carruagens que desfilam na praça destilando elegância. Por questões ideológicas e de consciência animal não sou a favor das touradas, mas devo reconhecer que fazem parte da alma audaz dos povos ibéricos.

Modas da Feria

Na "Feria" de Sevilha existe um protocolo e uma etiqueta bem definida do que e como vestir, para além das tendências que se vão alterando cada ano. Os sevilhanos têm um orgulho ímpar na sua "Feria" e por isso fazem questão de se vestir a rigor. Os homens vestem fato equestre ou fato de passeio com gravata. O conjunto mais informal para homem será umas calças de pinças, camisa ou polo fino com sapato de vestir. Nem pense aparecer em calças de ganga, ténis e T-shirt: será imediatamente excomungado.

A etiqueta feminina é mais complicada. O mais apropriado é o traje de flamenca, conhecido tradicionalmente como "gitana". Não diga nunca “vestido de sevilhana” porque vão ficar a olhar para si ligeiramente ofendidas. O traje de gitana é um vestido comprido até aos pés com folhos na parte inferior e corte ajustado tipo sereia que acentua as curvas da mulher andaluza. São elaborados numa panóplia de cores, cortes e padrões: com e sem mangas, folhos grandes e pequenos e também de preços. Pode-se conseguir um traje por 99 euros (El Duende de Sevilla), por 400 euros (Aires de Feria) ou optar por um traje assinado por um desenhador e os preços variam entre os 1.000 e os 4.000 euros (Ángeles Álvarez, El Ajóli, Luisa Pérez ou José Hidalgo, só para mencionar alguns...).

As tendências da moda flamenca é ditada em passarelas específicas (Simof) e seguidas criteriosamente pelas sevilhanas. As flores no cabelo, a peineta, os brincos, o xaile ou "mantón" são complementos obrigatórios. A maioria das sevilhanas usa o cabelo num apanhado baixo e maquiagem bem marcada: que não falte a cor nos lábios, o rouge nas maçãs do rosto e os olhos delineados a negro profundo.

A posição da flor no cabelo é sempre uma questão que levanta discussões apaixonadas e a tendência do ano é anunciada nos principais jornais andaluzes ao lado das notícias nacionais (ver o especial do ABC de Sevilha). Este ano a flor usa-se bem no topo da cabeça, mas em vez de ir centrada como em anos anteriores, deve-se escolher uma posição mais lateral. Naturalmente todas estas indicações não são obrigatórias, mas altamente recomendáveis para quem quer viver a "Feria" em todo seu esplendor.

Só na escolha dos sapatos é que existe maior liberdade, o importante é que sejam cómodos (são muitas horas de pé, de caminhada e de baile) e como estão semi cobertos pelos folhos, destila-se o uso de sandálias ou alpargatas de plataforma em cortiça ou corda. Os saltos agulha e os ténis estão completamente desaconselhados, mas vi corajosas erguidas durante horas em sapatos altíssimos.

Tradicionalmente os padrões dos vestidos querem-se de cores intensas e padrões vibrantes com flores ou bolas ("lunares") para o dia e já à noite é permitido o uso de trajes escuros e o negro. Este ano, a tendência foi o decote à barco e os vestidos escuros, mesmo durante o dia.

Eu tinha intenção de não gastar-me mais do que 200 euros no traje de flamenca, mas acabei por comprovar que existe uma enorme diferença entre a qualidade e o cair dos vestidos. Acabei por me decantar por um vestido com corte sereia e mangas, decote à barco com "lunares" ou bolinhas negras. Custou 470 euros na loja Aires de Feria. Ao vestido é preciso juntar o xaile (ou "mantón" que custa cerca de 80 euros, embora existam de vários preços chegando até aos 2.500 euros), os sapatos, as flores de cabelo, a peineta, o bolso, etc... Saí da loja com uma conta de 550 euros... mas valeu a pena... Quando vesti o meu traje de flamenca por primeira vez foi uma sensação de felicidade indiscritível. O vestido assenta que nem uma luva e favorece cada uma das curvas femininas.

O que ninguém confessa sobre o Traje de Flamenca

Envergar um vestido de gitana não é coisa fácil. A verdade é que o corte beneficia a qualquer tipo de corpo, e faz-nos sentir como uma princesa andaluza. Por outro lado, quando se utiliza o vestido durante várias horas começam a aparecer diversas incomodidades.

Primeiro fator: o peso. Um traje com todos os seus folhos e entre-saias pode chegar a pesar entre 7 e 10 quilos. Depois de algum tempo com o traje no corpo nota-se o peso na parte superior dos ombros.

Segundo fator, a ida à casa de banho. É óbvio que numa “Feria” onde a principal atividade é comer e beber, depois de alguns copinhos de manzanilla, é preciso ir “al baño”. Os trajes de gitana com corte sereia têm um fecho comprido mas mesmo assim, alguns precisam de ser despidos completamente. Já estão a imaginar o drama, despir o vestidos duas ou três vezes numa casa de banho minúscula e molhada... não é nada agradável.

Terceiro fator, o fio que corta a circulação. Todos os trajes trazem um fio na parte traseira para apertar o decote e dar ao vestido um ar final impecável. Tudo bem quando estamos de pé, o problema é quando nos sentamos. O fio fica apertado na zona do pescoço (levei um decote à barco) que não deixa respirar.

Ou seja, nem tudo são rosas, mas mesmo assim vale ABSOLUTAMENTE a pena vestir um traje de gitana para viver a Feria em todo o seu esplendor.

A "Feria" é uma festividade imperdível em Espanha uma celebração dos prazeres da vida, da chegada da primavera e do espírito vibrante de Sevilha. É o auge da Espanha folclórica, onde os vestidos coloridos do flamenco rodopiam ao som do flamenco e do trote dos cavalos puxando as carruagens pelas ruas do "Real", o perfume das laranjeiras e a beleza das sevilhanas enamora a quem passa, a música e a dança incessantes criam um ambiente de alegria, as pessoas bebem manzanilha e comem tapas, as multidões lotam a arena de touros para ver a melhores touradas... É como se fôssemos transportados para um parque de atrações folclórico onde tudo é vivido intensamente. Não há melhor postal da Espanha Imaginária.

Créditos Fotográficos: Avenida Chique

Para ver os vídeos da "Feria" visite a nossa Página de Instagram

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