O triunfo do New York Strip. Chef Wagner Clebis traz nova alma ao Bovino.
No Bovino da Quinta do Lago, um dos melhores restaurantes de carne do Algarve e em sempre competição renhida com o clube seleto das boas steakhouses no sul do país, sopram ventos de mudança. Mudou o chef e mudou para melhor, para muito melhor. O conhecido chef brasileiro afincado há vários anos em Portugal, Wagner Clebis, chegou ao Bovino para ver e vencer. Mudou a carta, mudou os fornecedores e mudou a cara (agora bem contentes) dos clientes. Eu caí rendida aos prazeres da carne. Do New York Strip e da Picanha, vamo-nos lá entender. Mas também dos maravilhosos cocktails, da garrafeira bem recheada e do serviço impecável.
Decoração de Luxo
Inaugurado há cerca de dois anos, o Bovino é daqueles restaurantes que apaixonam à primeira vista. A decoração foi assinada pelo estúdio espanhol Violán. Há uma mistura de elementos clássicos, vintage e hipster que contam histórias através dos objetos, dos quadros, das fileiras de frascos de farmácia, dos azulejos andaluzes ou dos candeeiros de coleção. Se não fosse pela oferta gastronómica de eleição, quase que valia a pena visitar o Bovino só para apreciar o ambiente interior. Honrando o protocolo das steakhouses de referência americanas, como a Smith e Wollensky, a Peter Luger em Nova Iorque ou o Harry's em São Francisco, à entrada do Bovino encontramos um mostrador com os diferentes cortes de carne maturada.
A renovação do antigo "Casa Velha" foi realizada pelo gabinete Essencia Architects e lembra agora, uma casa de herdade algarvia, caiada a branca e com friso pintado a vermelho-coral. Ninguém diria que nesta casa que data da primeira metado do século XX, já funcionou um dos lugares noturnos mais badalados da década de 90, o club O Pátio. As recordações desses dias guardam-se apenas nas memórias de quem por ali se divertiu, pois hoje, o espaço está irreconhecível. Existem certos detalhes que revelam influências mouriscas e até andaluzas, como o revestimento em azulejo das escadarias ou uma fonte de água fresca que canta num dos pátios interiores.
Wagner Clebis, o chef da carne.
O Bovino não tem apenas um, mas vários espaços interiores de atmosfera neocolonial que se estendem por salas e áreas interligadas. A decoração assinada por Lázaro Rosa-Violan tem um estilo eclético, tons quentes e peças vintage. Uma nostálgica coleção de frascos de farmácia antigos alinham-se na receção e no bar. O charme das lareiras acesas, um piano vermelho de teclas amareladas, as diferentes poltronas em couro bordeaux e verde, as paredes em madeira, as cabeças de bovinos e troféus de caça, as garrafeiras iluminadas em formato de espinha de peixe, aportam a este espaço uma interessante mescla entre o british club e o bistrot francês. Encontram-se também influências andaluzas, como os azulejos que recobrem certas colunas e pavimentos.
O ceviche de coco e o vinho do Gordon Ramsay
A nova carta vem recheada de boas novidades, especialmente no capítulo das entradas: por um lado as entradas plenas de conforto gastronómico e por outro as estradas saudáveis, para quem prefere algo mais leve e fresco. Pode provar, por exemplo, uma “1/2 dose de ostras da Ria Formosa” cozinhadas ao estilo Kilpatrick, ou seja, assadas no forno Josper com presunto e manteiga de ervas, ou a “Barriga de porco crocante” confecionada a baixa temperatura e glaceada com xarope de acer, compota de maçã e salada slaw picante.
Nesta visita escolhemos as entradas da zona saudável e provámos o "tartar de salmão com melão e mascarpone" e o "ceviche de garoupa", ambos servidos com um vinho muito especial. Trata-se do branco Ribeiro Santo, o único vinho branco português escolhido por Gordon Ramsay - chef hiperconhecido mundialmente pelo seu trabalho gastronómico e também pelo mau humor – para incorporar a carta dos seus restaurantes. Não sei se as notas frescas do Ribeiro Santo acalmam ou não o génio do chef britânico, mas a mim alegraram-me a noite. Chamo a atenção para o ceviche reinventado pelo Chef Clebis: encontra-se nele o toque sedoso do leite de coco, o frescor do coentros, dos cítricos e um curioso contraste entre a textura suave da garoupa marinada em lima e o crocante do coco fresco. Fantástico.
Um sommelier da velha escola
Aproveitei o intervalo entre as entradas e os pratos principais para ir conhecer ao pormenor a garrafeira em madeira branca e vidro. Fui pela mão do atual gerente e sommelier Jorge Domingues, um grande senhor da hotelaria de luxo, com mais de 20 anos de experiência em Inglaterra. Fomos sim ver a bela disposição dos néctares, mas a verdade é que me embrenhei à conversa com o Sr. Domingues e esqueci-me dos vinhos. Fico fascinada quando encontro alguém com uma história de vida rica e com tantas experiências por partilhar. Entre outras interessantes histórias, fiquei a saber da sua temporada no Hotel Savoy em Londres e dos jantares que serviu à Rainha de Inglaterra e a Frank Sinatra.
O triunfo do New York Strip
Chegou o momento dos pratos principais. A escolha era ampla, poderíamos ter ido para uma garoupa ou peito de pato grelhado, um lombo, acém ou um Chateaubriand da Argentina, uma picanha da Austrália, um T-Bone galego, um hambúrguer Black Angus ou um carré de borrego, entre outros pratos. Mas escolhemos provar uma picanha australiana e o “New York Strip” dos Estados Unidos. E que boa escolha. Ambas carnes de altíssima qualidade e apresentadas no ponto escolhido. Os acompanhamentos primorosos. Vieram os espinafres cremosos, os cogumelos salteados e a batata gratinada, mas poderíamos ter escolhido outros. Afinal há cerca de 12 acompanhamentos disponíveis e 6 tipos de molhos. Uma festa para os sentidos. Com a carne serviram-nos uma seleção de salmouras aromatizadas pelo chef: sal do Himalaya, um tomilho e alecrim, louro e alho. Gostei muito desta ideia, pouco vista no nosso país e que oferece um aroma especial à carne. Vale a pena experimentar.
O "New York Strip" é um dos melhores cortes de carne, e tal como o nome indica, é originário de Nova Iorque. Usado especialmente nas steak houses de alto nível, pode chegar a custar cerca de 90 euros. Basicamente é conhecido na gíria como o "pequeno t-bone". Deve ser uma carne marmorizada, com sabor amanteigado e maturada pelo menos à 28 dias. É raro encontrar em Portugal este tipo de corte, por isso deve ser devidamente apreciado.
Acompanhámos os pratos de carne com um vinho sugerido pelo sommelier Sr. Gomes, o Quinta de Valdoeiro, um Cabernet Sauvignon, tinto colheita de 2012 da região da Bairrada. É um néctar de cor vermelho escuro, a lembrar quase a cereja madura, as amoras e as groselhas. Um vinho recomendado para carnes vermelhas, com notas de especiarias e baunilhas, potente com taninos redondos e um final longo.
Cocktails elaborados por uma dupla vencedora
Tem apenas 24 anos e já é o melhor Barman de Portugal. O mais extraordinário é que não frequentou nenhuma escola de hotelaria, aprendeu tudo sozinho, em casa devorando livros e videos do Youtube. É um "self-made-man" à antiga. Dos que aprendem fazendo, trabalhando, errando e recomeçando. Começou a trabalhar no Conrad Algarve e depois de uma curta passagem por Londres, veio abrir, há dois anos, o bar de cocktails do Bovino na Quinta do Lago. Nascido e criado no Algarve, guarda no apelido e na tez branca a herança dos pais britânicos.
Conquistou-me com o “Pink Velvet”, um cocktail docinho mas com o ponto certo de acidez. A composição de vodka, limoncello caseiro, xarope de frambuesa, lima, clara de ovo e macarron de framboesa é um mimo. O exterior do copo está pulverizado com pó de framboesa liofilizada. A carta de cocktails idealizada por Montgomery está dividida segundo a base alcoólica dos preparados e em vez dos ingredientes inclui a descrição "em jeito de social media" através do uso de palavras chave. Nela encontramos uma boa seleção de clássicos com um twist, mas também as criações de Jaime Montgomery dais quais destaco o "Mary Pear" um dos best seller, e o "Bubbles Allure" com base de champanhe.
Mas detrás do balcão deste bar não se esconde apenas o "melhor barman do país", encontramos também a Rafael, que também já coleciona prémios de mixologia, entre eles o Martini Gran Prix. Ou seja, uma dupla de barmans digna de uma reedição do filme Cocktail.
Para fechar com chave de ouro, provámos ainda uma sobremesa de variação de laranjas algarvias elaborada pelo pasteleiro Daniel Chaveiro. Sobre uma base de lousa degustámos uma composição de pannacota de laranja, sorbet, borracha e chocolate branco. Um pequeno mimo e fresco e sem ser demasiado doce.
Como bem podem avaliar esta não é uma crítica gastronómica no seu sentido formal, mas sim um elogio franco ao bom trabalho gastronómico realizado atualmente no Bovino. E quando alguém faz algo bem é preciso aplaudir, ou não é?
Créditos Fotográficos: Avenida Chique Acompanhe o Avenida Chique no Facebook, no Instagram, no Twitter e no Google+!