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Aula Master Chef de Luxo com Heinz Beck, três Estrelas Michelin.

Três horas de sono. Heinz Beck, o chef com três estrelas Michelin, não precisa de mais. Não importa o dia da semana, o chef de estatura franzina oriundo da Bavária, deita-se às cinco da madrugada e acorda, fresco como uma alface, com o raiar do dia. A manhã começa com uma sucessão de telefonemas e vídeo-conferências. “Konnichiwa”, ouve-se do outro lado do telefone. As primeiras chamadas vão para os restaurantes de Tóquio. Pela diferença horária estarão agora a arrumar os últimos pratos. É preciso verificar o balancete de encerramento e averiguar os problemas da noite. “Problemas? Não, não. São desafios”, Beck corrige-me com uma minúcia germana. Depois, muda-se o registo para o árabe “As-salam alaykom”. Chega o momento de ligar para os restaurantes de Dubai.

aula de cozinha no Conrad Algarve com Chef Heinz Beck

É preciso energia para governar um império de oito restaurantes de alta-gastronomia espalhados pelo mundo. Ao todo são 304 empregados, a maioria chefes de cozinha qualificados que vão rotando entre os diferentes espaços: “É importante que conheçam novas realidades e que aprendam das boas práticas dos companheiros” explica Beck.

Em Itália, onde reside, Heinz Beck conta com três restaurantes: o Heinz Beck Seasons at Ristorante Castello di Fighine num romântico castelo na Toscana e o “Gourmet Restaurant Les Paillotes” na cosmopolita praia de Pescara, ambos com uma estrela Michelin. Em Roma, está o centro do império, o famoso La Pergola, no Hotel Rome Cavalieri, galardoado, ano atrás ano, com três estrelas Michelin, a mais alta distinção no mundo da gastronomia contemporânea.

podemos marcar uma diferença notável

na vida e na saúde das pessoas

Heinz Beck

Chef Heinz Beck, nascido na Bavária, italiano de coração.

O trabalho de um Chef Michelin não se resume ao desenvolvimento de técnicas e criação de novas iguarias que narrem estórias de sabores, ou à gestão dos números que tornem um restaurante rentável. Existe também a componente de investigação e estudo. Há já alguns anos, que Heinz Beck assumiu um compromisso com as Ciências da Nutrição, colaborando e desenvolvendo projetos com várias instituições e universidades italianas, como a Universidade Católica de Roma, a Policlínica Gemelli, a Faculdade de Agricultura da Universidade dePiacenza ou de Sesto Fiorentino. A investigação de Beck centra-se nos nutrientes e vitaminas dos alimentos, os benefícios da correta conjugação de proteínas, verduras e hidratos de carbono para uma digestão saudável, e no aprofundar do conhecimento sobre as intolerâncias. Quer na Europa, como nos Estados Unidos, no ultimo decénio tem vindo a registar-se um aumento exponencial de intolerâncias e alergias alimentares. Para Beck todos chefs deveriam saber mais sobre as ciências da alimentação: "podemos marcar uma diferença notável na vida e na saúde das pessoas”, conclui.

Heinz Beck interrompe a entrevista e deixa-me por uns momentos. Tem que regressar à cozinha do restaurante Gusto, para preparar com a Master Class de Cozinha, seguida de um menu de degustação de cinco pratos. Aos poucos, vão chegando os gourmands que participarão nesta exclusiva experiência gastronómica organizada pelo Conrad Algarve. Na mesa comprida, junto à garrafeira e com vista para a cozinha, alinham-se apenas dez lugares. A aula de cozinha do Três Estrelas Michelin é um evento exclusivo, uma espécie de concerto gastronómico “unplugged”, onde se pode usufruir do espetáculo ao vivo da arte culinária de Heinz Beck e provar as suas criações sibaritas.

nos olhos carregam um brilho intenso,

a incomparável paixão pela cozinha.

A cozinha abre-se ao restaurante como um palco corrido. Os ambientes de sala e cozinha são separados por um longo balcão polido. Na superfície de mármore negro enfileiram-se, pratinhos e taças em porcelana branca com legumes cortados, miolo de lagosta, lagostins e crustáceos, pós de legumes liofilizados de várias cores, especiarias, ervas frescas, pétalas de flores, tubos com vinho, caldos e sucos de cítricos. Diviso também uma Bimby. Oh, sim. Até os Chefs Michelin se deixaram contagiar pela febre Bimby. Ao lado um robot de cozinha, uma batedora de claras um mini-fogão de indução e um liofizador, ou seja, uma máquina que permite a conservação e preparação de alimentos através da secagem a frio. O liofilizador permite uma espécie de congelação brutal e instantânea, a 43 graus negativos e com pressão de 0,35 milibares, capaz de preservar os nutrientes, vitaminas, cores e sabores.

Beck inicia a Master Class recitando os títulos dos pratos e os ingredientes. Fala rápido. Uma mistura eclética entre o italiano e o inglês. Trata-nos com proximidade. Como se nos conhecê-se há muito. Na face miudinha desenha-se um sorriso humilde e generoso. Ivan Tronci, o chef executivo do Gusto e a brigada de chefs e ajudantes seguem atentamente cada passo, cada palavra, cada movimento do maestro. Às vezes, Beck pede assistência: “traz-me um pouco de caldo de vitela” ou “coloca o foie-gras no liofilizador”. Os jovens chefs respondem, num ápice, às ordens do mestre, os passos estudados como num baile. Têm um ar compenetrado, sisudo, mas nos olhos carregam um brilho intenso, a incomparável paixão pela cozinha.

Lavagante marinada em vinagrete de Yuzu e

erva-limão, com guacamole e macaron de soja

Levei papel e caneta e tirei apontamentos durante toda a noite. No final, ao revisar as minhas notas encontrei-me com uma miríade de ingredientes, técnicas, temperaturas e diagramas impossíveis de decifrar. Beck ri-se da minha atrapalhação e diz-me “para esta Master Class trouxe apenas os pratos mais simples, fáceis, que se possam pôr em prática em casa”. Não posso evitar devolver-lhe o sorriso. Só um génio, como Heinz Beck, pode olhar para o caos da complicação e dizer: “é fácil”.

Uma aula de cozinha com um Chef de três estrelas Michelin é uma experiência única e rara. Qualquer mortal, por mais vivências cosmopolitas acumuladas, fica deslumbrado com as técnicas e rituais de preparação dos alimentos, tão diferentes das que praticamos em casa. Enquanto elabora os pratos, o Chef vai explicando minuciosamente as receitas e desvendando alguns dos segredos da alta-gastronomia. No final, vem o melhor. A prova. A iguaria recém confeccionada é atacada pelas colheres gulosas dos gourmands e desaparece num mero instante. Ficará imortalizada nas nossas memórias sensoriais, mas também nos I-phones. São os sinais dos tempos modernos. Mesmo antes de provar o prato, os comensais fotografam furiosamente as obras de arte e partilham-nas, ao segundo, nas redes sociais. A pressão do online a entremear com a experiência do offline. E eu, mea culpa, faço o mesmo...

Salada fresca de melão, melancia fumada,

presunto de pato, geleia de presunto e foie gras liofilizado

Depois da aula de cozinha fomos convidados a degustar um menu especial, onde se incluíam os pratos preparados ao vivo e outras surpresas. Primeiro, uma Salada fresca de melão, melancia fumada, presunto de pato, geleia de presunto e foie gras liofilizado, harmonizada com um cocktail criado pelo barista Wilson Pires, à base de tequila, moscatel, cenouras, funcho, melaço de agave e sal de aipo, que veio prolongar as sensações doces do prato.

barista Wilson Pires, Conrad Algarve

Cocktail criado pelo aclamado barista Wilson Pires do Conrad Algarve.

Spaguettis em água de tomate, amêijoas e molho de rúcula

Spaguettis em água de tomate, amêijoas e molho de rúcula

Seguiu-se a Lavagante marinada em vinagrete de Yuzu e erva-limão, com guacamole e macaron de soja, acompanhada do vinho verde, Soalheiro. À continuação, os extraordinários Spaguettis em água de tomate, amêijoas e molho de rúcula, pareado com um vinho de aromas atlânticos, o Viúva de Collares, um malvasia da região de Lisboa.

A grande surpresa da noite foi um lombo de “Black Cod”, um peixe que nos pode enganar com a tradução ao Português, mas não no sabor. Trata-se do “Peixe Carvão do Pacífico”, que não pertence à família do bacalhau embora apresente uma consistência similar. O sabor? Feche os olhos e imagine a delicadeza do lombo de bacalhau fresco. Agora, eleve essa sensação ao quadrado. O Chef Beck cozinhou o “black cod” com uma redução de anchovas marinadas em vinagrete de soja e malaguetas vermelhas. Este prato de sabores marinhos tão especiais foi maridado com o vinho tinto “Bastardo”, monocasta da variedade homónima.

Para terminar este grandioso concerto de sabores, um copo de vinho da Madeira, Barbeito e uma sobremesa leve, mas de sabores profundos. A “Choco-Passion”. Uma mistura de crumbles de chocolates, esponja de chocolate, fudge de caramelo com flor de sal e sorbet de maracujá. Uma delícia com o toque certo de açúcar para terminar em apoteose o cardápio de três estrelas Michelin do Chef Heinz Beck.

Chef Ivan Tronci e Chef Heinz Beck. Gusto, Hotel Conrad Algarve.

O receituário

Passemos à ordem das receitas.

Receita de salada fresca de melão, melancia fumada, presunto de pato, geleia de presunto e foie gras liofilizado.

Parece fácil? Mas não, não é. Primeira dificuldade, elaborar o crumble de foie-gras liofilizado. Introduz-se um bloco de foie de pato no liofilizador para congelar e secar de forma instantânea e depois reduzir à textura de crumble [ver vídeo] Como em casa, ninguém tem este aparelho, imagino que o melhor é cortar o foie gras bem frio em dadinhos, porém, perde-se a textura única da liofilização e essa sensação de explosão em boca que se assemelha às petazetas.

A gelatina consegue-se elaborando um breve caldo com o presunto de pato, ao qual, depois de frio se adicionam folhas de gelatina. Leva-se ao frigorífico para solidificar e seguidamente corta-se a gelatina em cubinhos.

Para a assemblage da salada, misturam-se os dados de melão cantaloupe e de melancia fumada, a gelatina de presunto de pato, pimenta e sumo de lima e dispõem-se umas fatias finas de presunto no topo.

Na lateral coloca-se o foie-gras liofilizado e uns toques de puré de melão e de melancia fumada. O resultado é uma salada fresca de Verão, com toque adocicado e que revisita a receita clássica de “melão com presunto”, elevando-a à categoria de manjar dos deuses. Este prato pode ser degustado apenas no restaurante La Pergola em Roma (três estrelas Michelin) e agora, em Portugal, no Gusto do Conrad Algarve.

Salada fresca de melão, melancia fumada,

presunto de pato, geleia de presunto e foie gras liofilizado.

Receita de Lavagante marinada em vinagrete de Yuzu e erva-limão, com guacamole e macaron de soja

Para elaborar este prato, é preciso a preparação prévia de alguns ingredientes, alguns com 24 horas de antecedência. Serão necessários uns rabanetes “in carpione”, uma espécie de pickles adocicados, que se conseguem fatiando os rabanetes e marinando-os durante um dia inteiro, no frigorífico, num cocktail de vinho branco, vinagre de vinho branco, água, açúcar, pimenta rosa e folhas de louro. É impressionante observar a beleza rosada dos rabanetes depois de marinados, cuja aparência rosada lembra as delicadas lâminas de gengibre. Os rabanetes “in caprione” conservam-se bem dentro de um jarro de vidro fechado no frigorífico, durante pelo menos duas semanas.

Para o guacamole, fatia-se finamente o abacate e misturam-se cubinhos de chalotas e tomates previamente escaldados (blanchir, como dizem os franceses), fatiados sem pele ou sementes.

Os delicados macarrões de soja, elaboram-se com um merengue de água, clara de ovo, albumina, açúcar e soja, que vai ao forno por breves minutos.

A preparação da vinagrete de Yuzu, uma espécie de limão japonês, realiza-se também com 24 horas de antecedência. Prepara-se uma infusão de erva-limão, gengibre fresco, sumo de yuzu, vinho doce japonês, sake e pimenta rosa. Antes de servir, passa-se pela mini-pimer.

A lagosta é cozida durante 5 a 6 minutos e depois de fria, fatiada com delicadeza.

Para o empratamento, coloca-se a vinagreta no centro do prato e depois vai-se criando um jardim de texturas e cores com a lagosta, os rabanetes, guacamole, folhas de rúcula e rebentos de alface, os macaron de soja e uns apontamentos florais, com pétalas de violeta. O resultado é uma salada de aspeto e sabor delicadíssimo, uma experiência etérea, como o fru-fru das saias de tule das bailarinas. Extraordinário.

Spaguettis em água de tomate, amêijoas e molho de rúcula

O spaguetti. Este era um prato muito esperado, afinal, Heinz Beck com tantos anos de vivência culinária em Itália, desenvolveu receitas admiráveis para cozinhar “la bella pasta”. Trouxe-nos uma fórmula simples e de sabores consistentes. Chef Beck usou pasta da marca De Cecco, com quem trabalha há mais de 12 anos. Os spaguettis são cozinhados al dente. Porém, aqui o truque consiste em cozer metade do tempo em água com sal, e depois em água de tomate. Pergunto se devemos adicionar um pouco de azeite à água de cozedura, afinal, esta é, ainda, uma grande discussão em cozinha. “Niemals! (nunca) Os spaguettis cozem apenas em água e sal, ou, em águas perfumadas sem adicionar azeite. A gordura cria uma película no exterior da pasta que não deixa aderir o molho” explica-me o Três Estrelas Michelin.

De Cecco e Heinz Beck
agua de tomate de Heinz Beck

Preparação da água de tomate. Os tomates frescos trituram-se na Bimby e colocam-se numa taça, resguardando a polpa com um paninho para escoar o sumo, durante, pelo menos, 24 horas. Com este processo, um quilo de tomate origina cerca de 800 mililitros de água perfumada. Um truque simples e que aportará um sabor incomparável a este prato de spaguetti.

Segue-se a preparação do molho. As folhas de rúcula são brevemente escalfadas e imediatamente mergulhadas em água e gelo, para manterem a intensidade do verde. Na Bimby, misturam-se brevemente as folhas de rúcula, um pouco de batata cozida, sal e caldo de vitela, até conseguir um molho aveludado e verde brilhante.

As amêijoas cozem-se ligeiramente, até abrirem, e a água guarda-se para usar na emulsão final.

Finalizam-se os spaguettis abanando-os numa caçarola, com um toque de azeite, peperoncino (pimentão) e um pouco da água das amêijoas, que espessará ligeiramente.

No fundo do prato dispõe-se um círculo de molho, um novelo de spaguettis e as amêijoas. Aparência simples, sabores complexos. Ao meu lado, ouço um senhor irlandês a exclamar “são os melhores spaguettis da minha vida!”. Sou tentada a concordar.

Antes e depois: os pós de legumes liofilizados

transformam-se num caldo colorido e cheio de vitaminas.

No final da aula, o Chef Beck ainda exemplificou a preparação de um prato de lagostins panados, sobre uma paleta de pó de legumes liofilizados. Como se estivéssemos no laboratório de uma nave espacial, o Chef apresenta saquinhos com pozinhos às cores e forma montinhos coloridos: pó de ervilhas, pó de beterraba, pó de cenoura, pó de chicória e ervas aromáticas e pó de aipo. Estes pós irreais transformam-se num caldo de cores vivas ao adicionarem-lhe uma infusão de ervas aromáticas. Para Beck a liofilização é uma das tendências contemporâneas mais fortes, que permite apresentações espetaculares e preserva os nutrientes e as vitaminas dos alimentos. Cozinha espetáculo, com pozinhos de perlimpimpim. Heinz Beck, o chef cientista.

Ivan Tronci, Susana Wichels, Heinz Beck, Joachim Hartl

Chef Ivan Tronci, Susana Wichels (Avenida Chique),

Chef Heinz Beck e Joachim Hartl (Diretor Geral Conrad Algarve)

Para mais informação:

Restaurante Gusto by Heinz Beck

Estrada da Quinta do Lago,

8135-106 Almancil, Algarve, Portugal

Tel: (+351) 289 350 700

GPS: (37.061581; -8.02886)

Sobre o Blog

Sobre Mim

Um blog sobre a essência do bom viver. O Avenida Chique é um blog português sobre viagens, turismo e gastronomia para quem desfruta com os grandes prazeres da vida: restaurantes de eleição, hotéis e spas, os melhores vinhos e cocktails, viagens cá dentro e lá fora, artes e cultura. 

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