Degustando a obra do tritão dos mares, Chef João Rodrigues, do restaurante Feitoria (parte 1).
Esta semana fui degustar a obra culinária do Chef João Rodrigues (uma estrela Michelin), no restaurante Feitoria, situado no Hotel Altis Belém, em Lisboa.
Ao chegar ao restaurante deparei-me com uma grande surpresa. Não ia jantar na zona convencional, escoltaram-me até uma mesa alta localizada num contíguo espaço entre a garrafeira e a cozinha, a mítica mesa do chef, onde se magicam todos os segredos da alta-cozinha. "A noite promete", pensei eu, e não me enganei.
O ritual do bom comer iniciou-se com a chegada dos pães, a seleção de flor de sal Maldon e o dueto de manteigas, de leite de vaca de Esposende e de leite de ovelha de Azeitão. De dentro de uma cesta trazida por um empregado com luvas negras, escolhi uma deliciosa "focaccia quente de tomate seco e azeitona preta" e um interessante "pãozinho de salsa e cenoura". André Figuinha, mestre de sala e Sommelier apresentou-nos com primor um azeite virgem extra, reserva, da Quinta do Bispado de Trás-os-Montes, que verteu em fio de ouro para umas tacinhas de concha madre-pérola.
Enquanto na cozinha labutavam intensamente oito pessoas sob o olhar atento do Chef João Rodrigues e do Sous Chef André Cruz, iniciámos o cerimonial gastronómico com um copo de champanhe francês, Perrier-Jouët, Blason Rosé, Brut, da zona de Epernay em França.
Dueto de manteigas e sal em curiosas porcelanas em formato de conchas e crustáceos.
A seleção de pães, um flat-bread de sésamo, e a concha de azeite.
André Figuinha, Sommelier, mostra-nos o Perrier-Jouët.
Amuse bouche à Chef João Rodrigues
Começou o desfile gastronómico com quatro diferentes snacks e amuse-bouche, ou seja as entradas para entreter e animar a boca: o “Peixinho frito, sapateira e maçã verde”, o “Coral”, o “Como um bacalhau à brás...”, e a “Rocha do mar”. André Figuinha foi coordenando os tempos de apresentação dos pratos e escolhendo para cada criação gastronómica, a melhor sugestão vínica. Lisboeta de nascimento, Figuinha fez a sua formação na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril.
Peixinho frito, crocante de sapateira e o tubo de ensaio com sumo de maçã.
A primeira entrada, o “Peixinho frito, sapateira e maçã verde”, chegou numa taça em madeira repleta de seixos e flores e um curioso tubo de ensaio com um líquido verde. Na superfície da pedra erigia-se um delicioso crocante de pele de galinha recheado com carne de sapateira e um charuto de pregado estaladiço em massa brick. Neste prato, depois de provar os crocantes do mar, o chef convida-nos a refrescar o palato com a pipeta de sumo fresco de maçã Granny Smith.
"Para que servirá este utensílio?" perguntei.
Depois desta primeira incursão pelos sabores marinhos da cozinha do estrela Michelin, retiraram-se os pratos. Surgiu, depois, um curioso utensílio em cima da toalha de linho bordada a ouro: uma pinça de metal num círculo de lousa. Suspense. Surpresa. Para que seria este instrumento, mais próprio para uma sala de operações do que para um jantar gourmet? A resposta não demoraria em chegar.
Extraordinária apresentação do "Coral" sobre uma monte de sal marinho.
Aproximou-se um prato com um “Coral” branco, onde repousavam umas ingénuas gambas da costa na singela companhia de uma folha-ostra e umas algas “salty-fingers”. A pinça servia para pescar as gambas do coral, mergulhá-las numa maionese de cabeças de camarão (fantástico sabor), para depois levá-las à boca e saboreá-las em todo o seu esplendor. As gambas foram preparadas segundo o conceito new-sashimi. A folha de ostra, ou “mertensia marítima”, é uma planta que apresenta um curioso e distinguido sabor a ostra. Impressionante criação da natureza. A exótica apresentação, os excêntricos utensílios e os extraordinários sabores marinhos, transportaram-me para o conto da “Menina do Mar” de Sophia de Mello Breyner.
“Como um bacalhau à brás...”
Passámos depois ao “Como um bacalhau à brás...”. A desconstrução da iguaria típica da cozinha portuguesa, veio servida num original ovo de porcelana. Lá dentro, uma criação com espuma com um intrigante aspeto de cappucino. Figuinha, mestre-sala, explica-nos que é preciso introduzir a colher até ao fundo do ovo e emulsionar o preparado para que este se transforme, como por arte de magia, num verdadeiro bacalhau à brás. E assim faço. Qual é o meu espanto quando a gema cozida a baixa temperatura, os crocantes de batata e a emulsão de bacalhau se transfiguram, realmente, num tradicional bacalhau à brás. Tradicional em sabor, com o crocante da batata palha a romper o sabor meloso do ovo e do bacalhau. Vanguardista na apresentação e na assemblage final. Tradicional no sabor. Fantástico.
“a que sabe uma rocha do mar?”
O último andamento da sinfonia das entradas veio à mesa, pela mão do Sous-Chef André Cruz. Lisboeta de nascimento e filho de coração de Almada, o jovem chef de 27 anos, trouxe-nos um pequeno tesouro com uma pergunta latente “a que sabe uma rocha do mar?”. Em cima de um seixo encontrámos um arroz meloso de Alcácer do Sal com percebes, sublimado com três algas: cabelo de velha, salicórnia (ou espargo do mar) e pó de spirulina. O Sous-Chef Cruz explica-nos que é um prato rico em proteínas e vitaminas e completamente sem sal, já que o ponto salgado é dado pelas ervas halófitas que se adaptam à água do mar absorvendo o cloreto de sódio. Em boca, uma exaltação de sabores dos mares. Ao fechar os olhos, o paladar transportou-me para uma manhã invernal na costa de Peniche. Uma viagem atlântica para os sentidos...
Ficou com água na boca? ... este post fica por aqui, amanhã haverá mais sobre o Feitoria, em especial sobre as propostas de Peixes e Mariscos. Não perca...
Leia também:
Para mais Informação e Reservas:
Restaurante Feitoria
Hotel Altis Belém & Spa
Doca do Bom Sucesso 1400-038 Lisboa - Portugal Tlf:+351 210 400 205 Fax: +351 210 400 250
O Hotel Altis Belém, onde está situado o restaurante Feitoria, visto desde as docas.
Sommelier André Figuinhas dispõem cuidadosamente os elementos da requintada mesa no Feitoria.
A entrada do restaurante, com um bonito painel de arte Nambam
que retrata a chegada dos Portugueses ao Japão.