Perfume que preserva aromas da nossa realidade.
E se houvesse uma catástrofe natural e perdêssemos os aromas das coisas que nos são mais queridas? Do café que tomamos pelas manhãs? Do vento marítimo?
Uma artista tentou captar todas essas memórias em pequenos frasquinhos.
Quando era ainda uma adolescente li o "Perfume" de Patrick Suskind. Na altura o livro impressionou-me profundamente. A sua escrita sinestésica, onde cada palavra transmitia um sabor, um aroma, um som, um toque, um olhar impressionou-me. Foi talvez o primeiro momento em que pensei nos aromas e nos perfumes da minha vida. Aqueles que me reconfortam, como o aroma da tarte de maçã que a minha mãe costumava fazer. O perfume da terra molhada depois das primeiras chuvas. O aroma do mar numa noite de tempestade. O perfume de um livro antigo empregnado de tempo e sabedoria. Todas essas imagens aromáticas fazem parte de mim. Das minhas memórias.
No "O Perfume" o anti-herói, Jean Baptiste Grenouille, tenta captar todos os aromas do mundo e destilá-los em óleos puros, perfumes concentrados de vida.
Na vida real, há uma artista que decidiu empreender a mesma saga. Chama-se Catherine Young.
Esta artista anda genuinamente preocupada com o planeta. E não é para menos. Young teme que com a mudança climática provocada pelo contínuo aquecimento global, não seja possível preservar os perfumes únicos da natureza. Talvez Young seja uma visionária com um ponto de loucura. Não sei. Não me cabe a mim julgar.
Ela pretende com a sua obra captar e proteger aromas reais para poder transmiti-los às gerações vindouras. Um legado que segundo Young, nos poderia até ser necessário a todos nós, na incerta possibilidade de que um dia exista uma catástrofe global. Preservar os aromas e os perfumes para o mundo. Património da humanidade em essência aromática. É o que deseja Catherine Young.
Escolheu de momento oito aromas para proteger. Eucalipto, vinho, mel, amendoim, café, gelado, árvore de madeira e costa marítima. A eleição foi feita de forma subjetiva, uma homenagem às Filipinas onde a artista desenvolve o seu trabalho. Young encontrou uma empresa perfumista suíça com quem realizar o projeto: Givaudan. E da parceria saiu o perfume "Tempo".
Os aromas estão agora disponíveis para o mundo na exposição "O Projeto Apocalipe" no Mind Museum em Taguig, em Manila. As essências estão à disposição dos visitantes para liberar experiências sensoriais olfativas, mas não podem ser compradas.
Os perfumes vêm em pequenos frasquinhos de vidro com um rótulo onde se pode ler "T.E.M.P.S.", que significa "Tempo" em françês, mas é realmente o acrónimo do nome do projeto: The Ephemeral Marvels Perfume Store. Um pequeno colibri foi escolhido como logotipo porque segundo Young, é o pássaro que na mitologia faz parar o tempo, e é ainda sinónimo de amor, felicidade e alegria.
Esta não é a primeira vez que Young realiza um projeto destas caraterísticas. Quando ainda era estudante desenvolveu um livro de aromas de cidades: Barcelona, Nova Yorque e Manila. Young tentou captar as essências das cidades enquanto vivia nelas a sua própria experiência.
Espero que a exposição de Young chegue à Europa. Eu adoraria cheirar estas essências. Pergunto-me se realmente cheiram ao que dizem proteger. Talvez a memória olfativa de cada um seja diferente. Mesmo que não seja bem sucedida, Young já tem um mérito. Com a sua ideia devolveu-me um resquício de esperança. Porque eu daria as minhas lágrimas todas por ter num frasquinho o aroma a felicidade, ou seja à tarte de maçã da minha mãe.
Mais Informação:
Projeto Apocalipse: Catherine Young
http://apocalypse.cc/tagged/The%20Ephemeral%20Marvels%20Perfume%20Store
Mind Museum
http://www.themindmuseum.org
