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A surpresa do Leão. Leão de Porches, Lagoa.

Dizem que os prazeres inesperados são os melhores. A surpresa dessas aventuras imprevistas que nos acontecem quando saímos dos caminhos habituais. Estamos tão acostumados a criar expetativas em relação a tudo, que quando acontece o inesperado, ficamos boquiabertos perante a capacidade da vida nos surpreender. Poderia estar a citar alguma passagem de Paulo Coelho, mas não, estou a refletir sobre o que me aconteceu há alguns dias. Não foi nenhuma experiência espiritual, a tanto não chegou, mas foi uma experiência gastronómica absolutamente imprevista e talvez por isso me tenha deixado uma impressão tão favorável.

Andamos desesperados com a quantidade de pessoas que preenchem as praias, estradas, supermercados, restaurantes e demais espaços públicos algarvios. Claro, dirão. É o Algarve, em pleno Agosto! Perdidos por escapar-nos da confusão, fomos à procura de um lugarzinho simpático para jantar. Queríamos um sítio com charme, romântico, longe do bulício estival. Nesta altura, todos os bons restaurantes entre Almancil e Albufeira estão cheios de gente e queríamos uma noite descansada, só para nós.

Pois então, folheio a revista "Dinning Out" que reúne a lista atualizada dos restaurantes do sul e encontro referência ao "Leão de Porches". O nome recordava-me qualquer coisa, alguma experiência prévia, anos atrás, talvez com os meus pais. Mas levo tantos anos fora de Portugal que atualmente, "visitar o visitado" é uma nova descoberta. Então liguei para lá, a medo, porque com certeza que não ia conseguir mesa. Mas a voz simpática, lá do outro lado, deve ter percebido a urgência que eu tinha em ter uma noite tranquila e lá conseguimos a última reserva.

Metemo-nos então a caminho. Programámos a direção do restaurante no GPS e escolhemos a opção "estradas secundárias", para evitar o horror do trânsito da N125 e outros acessos conhecidos. Chegámos à pequena vila de Porches, no concelho de Lagoa. Depois dos edifícios novos, encontrámos um centro antigo com o charme da Igreja, praça e ruas empedradas, pequenas casas algarvias brancas e com as soleiras pintadas a azul e amarelo, iluminadas com a luz dos antigos candeeiros de rua. O GPS não se portou muito bem e lá demos duas ou três voltas completas à Vila antes de encontrar o sítio. Como sempre, o meu espírito prático queria parar para perguntar o caminho a alguém e o meu marido a insistir que conseguia encontrar sozinho. "Ah! Os insondáveis mistérios masculinos." Finalmente... um sinal! Ou melhor, divisámos um pequeno cartaz que nos indicava o caminho para uma ruela empedrada, pertinho da Igreja. Encontrámos o Leão!

Ainda andavam por aqui os Felipes quando se começou a construir a casa que alberga hoje o Leão de Porches. É uma casa de aldeia recuperada e que mantém a traça exterior e interior do século XVII. Chegámos relativamente cedo e a parte interior estava vazia. Isso é sempre mau sinal, penso cá com os meus botões (então não era a última reserva?). O meu marido, irritado por andar a dar voltas para estacionar o carro, chega e sente o mesmo desconforto... "Hum... Vamos a outro sítio?" Mas eu já estava estafada e portanto pisquei-lhe o olho e disse "Já que aqui estamos... ". Milionésimas de segundos depois, chega uma senhora que nos recebe com um amável sorriso e nos conduz pelo interior da casa até ao pátio exterior. Curiosos como somos parámos várias vezes pelo caminho. Eu fiquei para trás a fazer fotografias à decoração "old cottage style" e o marido a escolher os vinhos na prateleira junto ao bar. E a senhora, sempre amável ao nosso lado trata de explicar-nos os detalhes deste espaço aberto desde a década de 70. A casa foi descoberta pelo casal inglês Hugh e Meryl Cole e transformada inicialmente num club. Nessa época, o artista irlandês Patrick Swift, enamorado por Porches e pela olaria local foi o encarregue de recuperar o interior da casa utilizando as técnicas ancestrais da olaria algarvias.

Encantados com o interior, passámos ao pátio. Aí sim, já haviam várias mesas ocupadas e todo o espaço acabaria por ficar cheio com o andar da noite. Um pátio encantador. Mesas bem dispostas à volta de um antigo poço de água, enfeitado com velas e garrafas. Os muros caiados e com detalhes em azul. Um pequeno porche em telha com luzes penduradas, o tilintar dos sinos da igreja e vegetação mediterrânea compõem o quadro digno de um postal romântico. Quem veio estragar o ambiente foi um vento extraordinariamente frio que decidiu fustigar a todos os comensais. Mas até para isso, houve solução: mantinhas de lã para todos e de repente, a noite estival trouxe reminiscências das estações de esqui. Sim, aqui no Algarve e em pleno Agosto.

Foi Bianca Salden, a atual proprietária e gerente que nos veio cumprimentar à mesa, indicou-nos os vinhos e os pratos especiais. Pedi-lhe conselho para escolher os pratos que melhor representam a sua cozinha, sugestões que segui à risca e ainda bem! É preciso recordar que quando fazemos uma crítica de restaurante, não avisamos. Aliás, desta vez, a ideia era ter "só" uma noite romântica e não traduzir a experiência em crónica, mas aqui estou, impelida a escrever e a partilhar esta surpresa gastronómica tão agradável.

Pedimos as águas e um Niepoort Vertente 2010 da região do Douro, um vinho fresco e mineral, com cor rubi intensa, com taninos suaves e um bouquet de frutos vermelhos.

Entretanto chegou o trio de pães e uma manteiga aromatizada com raspa de limão, azeitonas algarvias (com gengibre?) e oregãos. O amuse bouche: um delicado gaspacho sublinhado com um espuma de pesto. Tudo bom. Até aqui ainda não sabíamos que nos esperavam umas entradas e uns pratos principais dignos (pelo menos) de atenção michelin. E assim, ingénuos, continuámos a ler a carta dos vinhos e a discutir (sempre a mesma discussão) se os vinhos espanhóis são melhores que os portugueses.

Chegaram quentes e fumegantes do atelier-cozinha, os primeiros pratos: " Vieiras, Açafrão, Escabeche, Gengibre Confit" e "Peito de Pato, Cogumelos, Legumes Glaciados". E ficámos sem palavras. Bestial a "mise en place". Bestial a sinfonia de sabores dinâmicos que surpreendia em cada garfada o nosso abismado palato!

Ainda ofegante desta primeira experiência, fui rapidamente coscuvilhar na internet do Iphone (já sei... isso não se faz num bom restaurante... "mea culpa") se o Leão de Porches tem estrela michelin ou pelo menos críticas excelentes. Apareceu-me logo um "Awful, awful, awful, awful!!!!!!!!!! " de algum comensal compulsivo de "fish and chips" ("sorry, but you know what i mean!") que despejou a sua frustração no TripAdvisor provavelmente enquanto esperava por algum EasyJet até Gatwick. Que coisa estranha. Digo, ao meu marido: "belisca-me que é para ver se estou acordada."

E assim, em plena alucinação gastronómica chegam os pratos principais "Corvina, Salada Algarvia, Batatas e molho de “Boulhão Pato”" e "Medalhões de Porco Preto, Bolbo de Aipo, Pimentos e Jus Picante". De novo, repete-se o fenómeno visual e gustativo dos primeiros pratos. Fantástico.

Portanto, já enamorada do Leão de Porches, quero saber quem é o chef! A Sra. Salden diz-me que o seu chef executivo é o jovem Daniel Marreiros. Explica-me também que tiveram por algum tempo ao chef britânico George Tannock para treinar a equipa e posicionar o restaurante. Bravo. Excelente aposta. Pois Tannock, que por certo nasceu em Portugal, deixou uma marca indelével. Recordemos que Tannock treinou dois anos com o três estrelas michelin Heston Blumenthal, na incontornável capital da gastronomia molecular, o restaurante Fat Duck. Trabalhou ainda no Capital Hotel - duas estrelas Michelin; no Green House -uma estrela Michelin e fez vários caterings privados para as famílias mais ricas e famosas do mundo.

Mas os aplausos devem ir para quem os merecem. E já passou algum tempo desde que George Tannock esteve no Leão de Porches. Por isso, os parabéns têm que ir, quase todos, para o jovem chefe português Daniel Marreiros. Terminou a escola de Hotelaria de Portimão, com o certificado Lausanne e o seu período de formação foi feito recentemente entre o Vale Da Lapa Resort, o Vila Vita Parc, o Sheraton Pine Cliffs Resort e finalmente com George Tannock no Leão de Porches.

Igualmente de parabéns está o serviço de sala, atento e minucioso.

Ao sair, ainda tive a possibilidade de conhecer o "mesmíssimo" Leão de Porches, o fiel cão que se passeia majestosamente pelos pátios e jardins exteriores do restaurante e que nos cortejou até ao carro.

Aponte a direção deste restaurante. Vale a pena.

O Leão de Porches

Rua do Correio, 8400-480 Porches, Lagoa

Tel. 282 381 384

E-mail: restaurante.oleaodeporches@yahoo.com

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Copyright: As fotos tiradas com o Iphone por Avenida Chique estão identificadas com marca de água.

As fotos sem marca de água são do restaurante e disponíveis facebook oficial do Leão de Porches. Copyright: Leão de Porches

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